02 julho, 2009

Quem fala demais?

“Parar de falar.”  O post-it grudado no meu computador tenta me lembrar, diariamente, dessa missão quase impossível. Dizem que falar muito é característica inerente às mulheres. Os homens são mais quietos, sóbrios. Na infância, minha mãe era a falante da casa, e, por conta disso, muitas vezes a falastrona. Meu pai, não. Discreto, quando abria a boca, lá íamos nós, os filhos, ouvir Sua Santidade, o Papai. Chuto que falar pouco é quase uma estratégia de marketing masculina, uma forma de dar peso maior ao que será dito.

Mas nem sempre as mulheres têm a chance de exercer seu direito de falar demais. Há alguns anos participei de um curso pela Fundação Heinrich Böll, em Berlim, sobre “Gênero, Agricultura e Desenvolvimento”. Durante dez dias, 60 mulheres de variadas nacionalidades discutiram a relação da mulher com a produção agrícola, seu papel no desenvolvimento familiar e comunitário, e as questões intrínsecas ao tema: preconceito, desigualdade e redução de oportunidades para as mulheres em grande parte do mundo – especialmente o rural.

Conheci angolanas que não tinham direito à terra herdada dos pais, por serem mulheres. Três representantes da Indonésia tinham vivido ou presenciado tantos abusos, que não se relacionavam nem se dirigiam mais aos homens. Era um desprezo construído menos pelos seus desejos e opções sexuais, e mais por décadas de opressão e violência.

Mas, no meio daquela legião de mulheres fortes e indignadas, saltava aos olhos a presença de três homens.  Um indiano radicado em Londres, um israelense e um nigeriano faziam parte da turma. Tive imediatamente simpatia por aqueles três exemplares do sexo oposto, demonstrando interesse para com a “nossa” causa.  Estava curiosa para ouvi-los, saber suas histórias, conhecer a trajetória de sua militância.

Mas o mundo é muito mais complicado. No primeiro dia, depois de uma intervenção do rapaz da Índia – um homossexual assumido, se é que isso vem ao caso -, uma mulher pediu a palavra e sugeriu que, durante o evento, os homens participantes não tivessem o direito de falar. Nem de fazer perguntas, nem de participar das discussões.

Deveriam ser meros espectadores. Comecei a rir, achando a ideia absurda. Mas o que se deu em seguida foi inesperado para mim. Cerca de metade das participantes concordou com a proposta. O argumento essencial era este: a desigualdade faz com que homens sejam mais preparados, articulados, e tenham maior facilidade para exprimir suas opiniões. Tanto sua eloquência como a ideia da sociedade machista de que “eles sabem mais” acabaria por intimidar muitas das mulheres dali, reproduzindo a opressão “da vida real”.

O clima esquentou.  Algumas mulheres gritavam: “Não tem lugar para vocês aqui!” Uma delas sugeriu uma votação: quem era a favor de que os três homens não falassem durante todo o curso que levantasse a mão.  No final, os ânimos foram acalmados e as organizadoras convenceram a todas de que aqueles homens tinham sido selecionados para estarem ali e tinham direito de participar.

O que se seguiu nos outros nove dias não foi surpresa. Nem sequer ouvi a voz do agricultor israelense.  Conheci o nigeriano fora da sala de aula, uma pessoa doce, simpática e extremamente engajada na causa das mulheres. Mas ele não se pronunciava durante as aulas. O indiano, mais indignado, fez discursos inflamados nos dias seguintes, interrompia intervenções de outras participantes e perdeu a simpatia de todos.

Conviver com aquelas mulheres foi um aprendizado, acostumada que estava a preconceitos mais velados, como ganharmos salários menores que homens, ou até anedóticos, como meu pai nunca ter trocado uma fralda dos filhos, mesmo minha mãe trabalhando fora tanto quanto ele.  Em muitas partes do mundo, as mulheres ainda sofrem preconceitos muito mais dramáticos, vinculados a violações diárias de direitos universais. Fácil entender atitudes tão radicais contra o sexo masculino.

Foi Rui Barbosa quem disse: “Tratar com desigualdade a iguais, ou a desiguais com igualdade, seria desigualdade flagrante, e não igualdade real”.  Ele falava da tal equidade.  Sempre tão oprimidas, talvez naquela situação as mulheres precisassem oprimir seu opressor para garantir voz.  Mas o desconforto de como tratamos aqueles três homens bateu forte em mim.

Um desfecho cômico para um assunto difícil. No meio do evento, tivemos um problema com o data show que projetava as palestras. Primeiro, a palestrante tentou resolver o problema.  Depois a organizadora foi lá, e nada.  Aos poucos, as participantes mais “tecnológicas” desciam da plenária, cada uma tentando fazer a máquina funcionar. Após meia hora de tentativas, a organizadora chamou por telefone alguém para ajudar.

Entra no auditório um rapaz, óculos fundo de garrafa, mirradinho. Olha em volta, um pouco acuado. Sobe ao palco, aperta um único botão do data show e voilà, como mágica o troço volta a projetar.  Eu, que perco o amigo, mas não perco a piada, soltei: “E não é que eles, os homens, servem pra alguma coisa?!”  Só metade da plateia riu.
(publicado originalmente na Revista Página 22 - www.pagina22.com.br

08 junho, 2009

Não aguento mais rúcula

Uma das coisas que credito à globalização – e sou grata a ela – é a combinação rúcula-tomate seco-muzzarela de búfala. O trio é banal hoje em dia. Você encontra os ingredientes em qualquer mercado e no cardápio de todo restaurante.  Mas quem tem mais de 30 anos deve lembrar: quando éramos crianças, esses ingredientes não existiam nos supermercados.  Tínhamos nossas alfaces, mas nada equiparado à rúcula.  Tínhamos nossos tomates, mas nada igual ao tomate seco.  O mundo globalizado colocou em nossa mesa a mesma comida dos pequenos vilarejos italianos.  Mas não necessariamente diversificou nosso cardápio.

A ideia de que só a agricultura industrial poderia dar conta de alimentar o planeta todo é um dos grandes mitos da globalização.  Seus defensores idolatram o avanço tecnológico da produção alimentícia em grande escala, que soube superar as limitações relacionadas às estações do ano, às localidades geográficas, aos riscos de pragas.  O resultado?  Você pode comprar sua rúcula em qualquer lugar, em qualquer época do ano.  O problema?  Ai de você se bater uma saudade das alfaces de antigamente.  Daqui a pouco, elas não existirão mais.

A variedade conhecida no Brasil como “alface americana”, famosa pela sua absoluta falta de sabor na minha humilde opinião, foi responsável na última década por mais de 70% de toda a produção de alface nos Estados Unidos.  No percurso, os americanos extinguiram uma centena de outras variedades, de amargas a doces, de roxaescuras a verde-claras.  O mesmo acontece com as maçãs.  Graças aos processos industriais, temos hoje acesso às maçãs vermelhas americanas o ano todo.  Mas o preço foi alto.  Não se encontram mais os milhares de variedades que existiam até o século passado.  Apenas duas variedades são responsáveis por mais de 50% do mercado americano.

Quem levanta esses dados é Andrew Kimbrell, organizador do livro Fatal Harvest, que acusa a monocultura da agricultura industrial de ter reduzido a diversidade natural de praticamente toda produção agrícola em termos de tamanho, cor e sabor.  De novo, resgatemos a memória dos trintões.  Nós chegamos a conhecer o sabor verdadeiro dos morangos, pequenos e feios nas prateleiras.  Hoje, o morango é igual em todo o lugar: tamanho acintoso, brilho ofuscante, sabor medíocre.

A limitação trazida pela agricultura industrial globalizada não é apenas ruim para nosso cardápio.  Ela reduz as escolhas das futuras gerações. Recentemente o jornal The New York Times relatou a expedição do cientista Andrey Sabitov à uma remota ilha na Rússia. Um lugar inóspito e frio.
Depois de três dias de caminhada, ele atingiu o vulcão Atsonupuri, para encontrar o que foi buscar: o morango silvestre Fragaria iturupensis, uma variedade não domesticada, parte de um esforço internacional de proteção de sementes ligado às preocupações com as mudanças climáticas.  O aquecimento global, as secas e o aumento da salinidade das águas devem extinguir muitas variedades agrícolas.

Uma operação importante, portanto, é salvar sementes de variedades com maior potencial de sobreviver às alterações climáticas. E adivinhe. Frequentemente, as variedades selvagens mostram muito mais adaptabilidade do que as domesticadas.

COLORIDO SEM GRAÇA O problema é que, no passo que estamos, as variedades simplesmente não existirão para contar a sua história. A Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) estima que no último século perdemos 75% de toda a diversidade genética agrícola mundial. Segundo pesquisa da Rural Advancement Foundation International, em apenas 80 anos – entre 1903 e 1983 - os inventários de estoques de sementes diminuíram vertiginosamente. Perdemos 96% das variedades de milho, 95% das variedades de tomates e 98% da variedades de aspargos.

Por isso, a paisagem do supermercado é traiçoeira. Aquele colorido todo não representa, na prática, tanta diversidade. A indústria alimentícia aperfeiçoou-se em variações sobre os mesmos temas: milho, soja, trigo e arroz.  Dois terços de todas as calorias ingeridas pelo homem vêm deles. É uma simplificação radical das potencialidades da alimentação. Mas a matemática serve ao mundo moderno. Temos hoje variedade apenas dos alimentos que atingiram em escala mundial eficiência na plantação, colheita, distribuição e embalagem. E é possível contar nas mãos as empresas detentoras das marcas.

O ciclo é vicioso. Grandes empresas atingem um nível de distribuição em escala mundial que atende as grandes redes de supermercado, que, por sua vez, facilitam o trabalho das compras dos restaurantes.  Alimentos mais regionais, peculiares e menos eficientes, não chegam às prateleiras. Comprar de pequenos agricultores dá trabalho, custa mais caro e impõe riscos. Mas o consumidor agradece.  Acredite. Pode chegar o dia em que você, assim como eu, não vai mais aguentar rúcula.
(publicado originalmente na Revista Página 22 - www.pagina22.com.br)

02 maio, 2009

A ciência e o biquíni

Cara: vai chover e ficamos em casa. Coroa: vai fazer sol e vamos para a praia.”  Era assim que um amigo de juventude lidava com qualquer decisão. Almoçaremos hambúrguer ou caqui?  Para a gripe, sorvete ou chá quente?  Tudo era sorteado, para o Bem ou para o Mal.  Escondidos atrás do véu da ignorância, conferíamos a responsabilidade das nossas ações à moedinha de cruzeiro. Bons tempos.

Conforme crescemos, os dilemas tornam-se mais complicados e as decisões mais difíceis. E a maturidade nos exige fundamentar decisões em avaliações criteriosas, baseadas em evidências, relações causa-efeito, especialização do conhecimento. Com vocês, a moeda de um lado só: a ciência.

Hoje, a meteorologia é quem define meu fim de semana, pois, afinal, tem gente contando os cumulus nimbus só para sinalizar se vou poder pegar um bronze em Ubatuba. Nas refeições, sou obrigada a escolher o caqui, porque alguém se deu ao trabalho de calcular as calorias pornográficas do saudoso hambúrguer. E sorvete gripada? Faça-me o favor!

Eles estão por aí, observando, fazendo experimentos, colhendo números. Os cientistas são incansáveis em sua jornada para nos revelar a Verdade. Graças a eles, sabemos que o planeta é redondo e que o céu não vai cair sobre nossas cabeças.  Devemos a eles a sabedoria de que basta uma gotinha na infância para evitar a paralisia no adulto.

Por causa deles, somos capazes de – quase sempre – fugir de uma cidade antes de um terremoto, de saber que comer algo estragado nos mata, de entender que precisamos perdoar nossos pais para amar nossos pares. Mas se a pesquisa científica pode servir de orientação, algumas vezes mais complica que esclarece.  Em uma semana eu tomo um cálice de vinho para evitar ataque cardíaco, na outra me martirizo, pois aquele mesmo cálice aumenta minhas chances de morrer de cirrose.

E na sustentabilidade é igual.  Parar de consumir carne ou soja?  Neutralizar as emissões do meu carro dá no mesmo que andar de bicicleta? A energia de hidrelétricas é melhor que a nuclear? Mais uma vez os cientistas estão lá, prontos para nos confundir. Nas prateleiras da academia, tem prova para tudo: basta escolher o que melhor lhe apetece. A verdade inconveniente é que, perante tais impasses, você terá de fazer escolhas, baseadas em seus valores e ideais, porque a ciência, meu caro, nem sempre vai ajudá-lo.

Se em muitos assuntos cabeludos ainda não há consenso, na questão do aquecimento global a confusão é pouca. Há pesquisas abundantes e evidências suficientes para deixar claro o perigo que estamos correndo. Qualquer pesquisa provando o contrário é olhada com desconfiança. Ainda assim, na ânsia de publicar pesquisas inéditas e na sede por novas descobertas, às vezes os cientistas se perdem.

Recentemente, acusaram o Google de ser um dos grandes vilões das emissões do planeta. Segundo o pesquisador Alex Wissner-Gross, da Universidade Harvard, o gigante da internet consome energia demais para oferecer aos internautas seu consagrado sistema de busca.  O próprio Google achou que precisava responder à crítica, passando a anunciar que cada busca em seu site produz apenas 0,2 grama de carbono na atmosfera, e não os 7 gramas calculados pela pesquisa.  E aí, você que não fez nem mestrado nem nada se pergunta: não seria muito pior se eu tivesse de pegar o carro e ir até uma biblioteca?

Outras vezes, as pesquisas vão longe demais – ou de menos -, especialmente as que se baseiam em estatísticas. Estudo publicado em abril pelo renomado International Journal of Epidemiology acusa os obesos de emitirem mais carbono que os magros. Altas taxas de obesidade em países ricos causariam toneladas extras de emissões de gases de efeito estufa em comparação com países com populações mais magras.

No modelo, os cientistas compararam uma população “magra”, de 1 bilhão de pessoas, com distribuição de peso equivalente a um país como o Vietnã, a uma população “gorda”, tal como a dos EUA, da qual cerca de 40% é obesa.  A população “gorda” precisaria de 19% mais energia proveniente de alimentos, além de maior uso do automóvel, considerando o maior esforço para transportar o próprio corpo.

Na estimativa, calculou-se que as emissões de gases de efeito estufa da produção de alimentos e transporte para o bilhão de pessoas mais gordas ficariam entre 400 milhões e 1 bilhão de toneladas extras por ano. Se comparado com o total de emissões globais de 27 bilhões em 2004, é um valor expressivo. Para os cientistas, a descoberta é “preocupante”.  E enfatizam que, a partir de agora, ser magro não é apenas bom para sua saúde – também é melhor para o planeta.

Mas as nações mais ricas consomem mais de tudo, não apenas comida.  Tem o automóvel, a TV de plasma… Não bastaria só restringir o a sobremesa dos obesos. Seria necessário uma dieta do consumo. Algo como: a partir de segunda-feira não vou mais trocar de carro todo ano! Ou seja, o buraco é mais embaixo.

As pesquisas acadêmicas nutrem a sociedade de informações e reflexões. A produção científica é um dos grandes indicadores de desenvolvimento de um país e alavancador de oportunidades.  Mas cuidado para não comprar tudo que se apresenta. É como aquela piada. Algumas vezes, a pesquisa científica é como o biquíni: mostra tudo, mas esconde o essencial.
(publicado originalmente na Revista Página 22 - www.pagina22.com.br

06 março, 2009

A batalha desleal entre um corvo e 150 pokémons

Vivo recentemente um dos muitos dilemmas da maternidade: proibir ou não a televisão para meu filho pequeno.  Mas, ao liberar – em doses homeopáticas – seu acesso à TV, eu me depareicom uma situação peculiar.  Tendo à sua disposição coelhos “fofinhos” pulando freneticamente para cima e para baixo no programa infantil Bunnyworld, ou podendo acompanhar o Mickey num mundo mais colorido que loja de tintas, meu filhote praticamente exige que a telinha esteja sempre ligada no canal Animal Planet.

É difícil acreditar que do alto de seus 2 anos de vida ele esteja tão interessado nos chimpanzés que vivem em cativeiro, ou no estômago invertido do bicho-preguiça, ou naquele inseto albino africano. Mas o fato é que o pequeno não desgruda os olhos desses bichos todos.  Não sei se a TV é o ópio do povo, mas, ao menos lá em casa, o Animal Planet dá barato.

Não é novidade o interesse provocado por imagens de natureza.  Nossas primeiras palavras estão invariavelmente associadas a um animal, mesmo nos bebês urbanos – ou vai me dizer que au-au não está entre as dez primeiras palavras pronunciadas pelo seu filho?  A fascinação – de grandes e pequenos – por animais e plantas tem até explicação científica: a biofilia.  Formulada pelo biólogo Edward Wilson, seria uma ligação emocional cravada em nossos genes e transmitida pela história evolucionária da nossa relação íntima e dependente com outros seres vivos.  Para alguns, a afinidade incluiria também a natureza não-viva, como rios e montanhas.

Eu gosto de pensar que meu menino, efemeramente preservado de videogames, orkuts e afins, tem um interesse adquirido de forma ancestral pelo ambiente natural.  Mas essa “sina” hereditária por si só não garante que ele seja um conservacionista no futuro.

Uma das atividades marcantes da minha época de faculdade foi levar crianças pré-adolescentes ao Vale do Ribeira.  Elas enlouqueciam ao entrar numa caverna, com lama e água até a cintura.  Sempre pensei que aquela experiência dramática, de escuro e frio, de adrenalina e medo, dizia mais que mil palavras sobre a preservação das cavernas.

Pesquisadores da Universidade Cornell, nos Estados Unidos, investigaram 2 mil americanos para entender a relação entre experiências infantis na natureza e comportamentos ambientalistas dos futuros adultos.  E descobriram que o envolvimento de determinada criança com a natureza “selvagem” – por meio de caminhadas pelas florestas, campings e contato com animais – teve um efeito positivo e significativo em sua relação com o meio ambiente na vida adulta.  Ou seja, é a sensibilidade “construída” à base de experiências no mundo natural que poderiam influenciar para valer atitudes voltadas para a conservação.

Se as trajetórias pessoais moldam aquilo que um dia poderia nos ter sido “inato”, a industrialização e a urbanização, ao restringir nossas interações diretas com a natureza, podem desviar o caminho dos ambientalistas de amanhã.

Uma pesquisa feita pela entidade britânica National Trust revelou que as crianças de hoje passam tanto tempo trancadas em casa que o mundo natural se tornou algo estranho a elas.  Um terço das crianças entre 10 e 12 anos que participaram da pesquisa não foicapaz de identificar um corvo, o pássaro mais comum da Grã-Bretanha.  Metade não soube diferenciar uma abelha de uma vespa.  Entretanto, nove entre dez crianças foram capazes de identificar o personagem Yoda, da série Guerra nas Estrelas.

Outra pesquisa, realizada pela Universidade de Cambridge e publicada na revista Science, investigou o conhecimento de crianças de 4 a 11 anos sobre plantas e mamíferos e “espécies” do desenho Pokémon.  A identificação de espécies do mundo natural foi baixa e cresceu de 32% aos 4 anos para 53% aos 8 anos.  Já a identificação de Pokémons – que incluía observar dez cartões randomicamente selecionados em uma base de 150 “espécies”!  - disparou, de 7% em crianças de 4 anos para 78% nas de 8 anos.
A pesquisa evidencia que crianças têm uma capacidade admirável de aprender sobre “criaturas”, naturais ou não.  Mas, por terem poucas oportunidades de conhecer espécies reais, elas acabam desviando sua atenção para as virtuais, mais presentes em seu dia-a-dia.

Se as crianças têm um gosto inato de estarem próximas da natureza, deveríamos envolvê-las mais em estratégias inovadoras de aprendizado.  Ajudá-las a construir, valendo-se do inato, uma trajetória de envolvimento e respeito pelo mundo natural.  De minha parte, adoro o mestre Yoda e acho que, assim como os chimpanzés e os corvos, ele pode e deve fazer parte do universo do meu filho.  Mas, enquanto não o levo às cavernas do Ribeira, não há mais dilema: vou lá ligar o Animal Planet.
(publicado originalmente na Revista Página 22 - www.pagina22.com.br)